156. Nunca compreendi porque traduzem
physis por “natureza”(embora eu mesmo, um tanto confuso, tenha assumido essa interpretação uma ou outra vez). A partir de tal interpretação, o meu fragmento 123 é comumente lido assim: ”a natureza ama esconder-se”. Mas como poderia a natureza esconder-se? – pergunto atônito. A natureza está aí, e a ciência a incomoda constantemente com os seus dedos curiosos e impertinentes.
Physis é bem outra coisa. Gosto particularmente daquela sugestão de Heidegger – “vigor imperante”. Em uma leitura livre, diria que a
physis não é a coisa, mas o vigor: o florescer da rosa, o cantar de todo o canto, o dar-se de todo ser. Somente a
physis, assim compreendida, pode ocultar-se! Quem já deteve o vigor que emerge? Apreende-se, sem dúvida, uma rosa, mas não o seu florescimento.
157. Porque a
physis é o vigor (e não propriamente a coisa), posso dizer que
physis e
polemos são o mesmo. É que a
physis não é suave linha que desenha e define, mas turbilhão que dissemina e arrebata.
Physis é inauguração e ruptura. Como a explosão de uma fonte do íntimo da terra úmida.
158. Costumam atribuir a mim a palavra grega
philósophos que remeteria àquele que ama o
sophón. Daí muita coisa mais se disse, como:
“o elemento específico de philein
do amor, pensado por Heráclito, é a harmonia que se revela na recíproca integração de dois seres, nos laços que os unem originariamente numa disponibilidade de um para com o outro”. (Heidegger,
O que é isto- a filosofia?, p.32) Mas é preciso compreender bem, pois eu defenderia que a dis-ponibilidade nada mais é senão o embate do
polemos . Humano e
sophón se amam enquanto se entranham e se desentranham. Somente no conflito, o amor. O amor que des-faz e des-loca. O amor que é diálogo do estranhamento fascinado.
159. Mas como entender a micropolítica do
polemos? Como pequenos des-locamentos, já afirmei certa vez. E o que são, afinal, esses ditos des-locamentos? – poderia alguém curioso ou confuso perguntar. Nada além de “desejos” – respondo eu. Ou talvez, para usar uma delicada expressão de Empédocles da qual gosto muito, “amor envolvente” (o que envolve não é o que absorve e acomoda, mas o que abre e amplia, o que dis-põe, como a brisa do mar que invade as narinas ou o sal das águas que arde na pele depois do enfrentamento das ondas. Falo do amor dos que não dormem).
160. Desejo e
polemos são um.
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